segunda-feira, 3 de setembro de 2012

A MACONHA EM DEBATE


Jornal do BrasilVanderson Carvalho Neri*
Segundo dados recentes divulgados por pesquisadores da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), um em cada dez brasileiros adultos já experimentou maconha. De acordo com dados da mesma pesquisa, 1,5 milhão de usuários usam a erva frequentemente no país, e deste total, 1,3 milhão, aproximadamente, já são considerados dependentes. Trata-se, portanto, da droga ilícita mais consumida no país.
A Cannabis sativa, nome científico dessa erva conhecida pela humanidade há cerca de 6 mil anos, tem sido alvo de discussão e debates ao redor do  mundo a respeito de seus efeitos sobre o organismo e o impacto que sua legalização teria sobre a sociedade. No último relatório da Organização das Nações Unidas sobre o assunto, a instituição estima em 150 milhões o número de usuários diários da planta ao redor do mundo, mas, por se tratar de uma prática ilícita, esse número pode ser ainda maior devido à inibição do usuário em responder aos institutos de pesquisa.
Estatísticas à parte, o que temos certeza é que a Cannabis possui efeito direto sobre o sistema nervoso central, principal alvo da ação dos  seus canabinoides na gênese do efeito alucinógeno e do “bem-estar”. É sabido que sua ação altera, a longo prazo, a percepção e a cognição, pode aliviar o estresse físico e mental, mas tem grande chance de levar à dependência psicológica. Seu efeito entorpecente, por exemplo, condiciona o indivíduo à amnésia, lentificação do raciocínio, diminuição dos reflexos e alteração dos atos motores.
A dependência se concretiza e manifesta quando há a presença de alterações físicas ou emocionais na ausência do consumo da substância. No contexto das drogas ilícitas, a maconha tem um menor efeito de dependência, sobretudo se comparada com outras classes, como o álcool, o crack ou a heroína. Entretanto, como existe um alto número de consumidores, proporcionalmente, o número de dependentes também é muito significativo, e por isso tem grande impacto social.
Apesar disso, o número de políticas governamentais ou públicas que atentem sobre esse fato são modestas, o que vulnerabiliza a situação dos dependentes e colabora para a formação de novos usuários e, consequentemente, a fomentação do crime organizado e do banditismo social.
O debate mundial a respeito dessa “planta da discórdia” tem várias vertentes: saúde pública, econômica e legal. No tocante à saúde, devido aos seus efeitos lesivos sobre o organismo do dependente e o impacto disso na sociedade; economicamente, pelo consumo desenfreado de uma substância não tributada; e legal, por se tratar de um dos braços de financiamento da máfia e do crime organizado. Nesse conjunto de substâncias ditas ilícitas, também devem ser lembradas a heroína, o crack, o ecstasy, o haxixe e o LSD, entre outras menos consumidas, além, é claro, do álcool, substância psicoativa de maior consumo em todo o mundo, com efeitos mais devastadores do que todas as outras juntas.
O fato é que todas essas composições químicas, incluindo a maconha, têm efeitos nefastos sobre o organismo do usuário e sobre a sociedade. Também é fato que a humanidade não caminhará em seus dias sem a presença de drogas lícitas e ilícitas; seria ingenuidade de nossa parte pensar o contrário.
Por isso, a discussão a respeito do uso da maconha não deve só se reter apenas no potencial de dependência da droga, ou nas características de sua legalização, mas preferencialmente na implementação de políticas públicas que atuem efetivamente na educação, esclarecimentos, na prevenção do consumo desenfreado e no tratamento de usuários com uso sintomático, hoje talvez aspectos pouco valorizados no debate sobre a droga e essenciais para o controle da atual situação. 
* Vanderson Carvalho Neri é médico neurologista. - vandersoncn@yahoo.com.br

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